PERCEVEJO AZUL BARATEA

PERCEVEJO AZUL BARATEA
Memórias da caserna

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

COMO NÓS E OS PERCEVEJOS COMEÇAMOS E TERMINAMOS

COMO NÓS E OS PERSEVEJOS COMEÇAMOS E TERMINAMOS

Todos, ao se dirigirem para o Setor de Alistamento Militar, na antiga Escola de Aeronáutica, com nenhuma ou um mínimo de informação, estavam imbuídos do espírito de busca por um lugar na “aeronave” que iria decolar para o futuro. O futuro chegou, ao se passarem mais de oito anos de buscas, tentativas e frustrações impostas pelos preconceitos dos que já estavam “estabelecidos”. Para nós tudo era mais difícil, pois tão logo incorporou a 1ª turma de recrutas de 1965, começou a perseguição militar com “desanimantes” provas de que não queriam que conseguíssemos progredir na nossa “pequena” carreira militar de praças que desejavam o topo que não conheciam. Sabíamos, no período em que “consentiram” que ficássemos na ativa da FAB, que a nossa meta deveria ser o posto máximo no circulo das praças da FAB, pois na época o posto máximo da carreira era o de Suboficial, alterado critério mais tarde para capitão, chegando a esse posto com promoções de dois em dois anos a partir da promoção a S.O., ostensivo, também aos primeiros Sargentos mais antigos na falta de um S.O.
No todo, não era nossa ambição chegar ao oficialato, pois o nosso status não era de nível superior, embora uns pouquíssimos colegas, com esforço e um pouco de sorte, concluíram suas faculdades.
Quem já estava integrado na tropa, tinha que enfrentar as escalas de serviço e a rigorosa “fiscalização” dos Sargentos e Oficiais da Cia de Infantaria de Guardas, sendo surpreendidos, também, por alguns oficiais especialistas e até intendentes, que resolviam tornar nossas vidas no quartel angustiante, fazendo exigências exageradas, levando colegas a serem chamados para justificarem as mais diversas “faltas” na Cia de Infantaria de Guardas, que era responsável pela “disciplina” no Parque de Aeronáutica dos Afonsos. Era muito difícil alguém sair sem punição depois que entravam na sala para serem olvidos na “Hora do Pato”, geralmente por um Tenente ou Capitão, quase sempre de Infantaria. Havia, também, dentro dos quartéis, as “patrulhas ideológicas”. Tudo que se falasse, poderia ser questionado por um Oficial Superior, no fechado.
Para leitura de livros, sempre se acha tempo e para estudar, também, porém precisávamos de muito mais tempo que o que nos era dado, pois nossa escala de serviço, depois de um longo período a 24 x 24, quando começaram a por os cabos mais velhos na rua, passou a 24 x 48 e depois ficou mais relaxada, porém volta e meia surgiam as prontidões e sobreavisos por conta de atentados terroristas que nos impediam de sair dos quartéis.
Os que davam a sorte de trabalhar em seções compostas de cabos, soldados, sargentos, civis e oficiais compreensivos, tinham uma vida mais folgada, podendo comparecer ao quartel somente nos dias da escala de serviço; os poucos que eram beneficiados se enquadravam nessa condição ou eram parentes ou conhecidos de sargentos e até de oficiais, que podiam dar uma condição melhor para eles melhorarem seus currículos escolares.
Apesar de tudo que eu via acontecendo nos meus dias de serviço como cabo da guarda, cabo do reforço e patrulha na Sulacap, me deixando chocado com tanta prepotência os que ostentavam o poder da autoridade; oficiais e até componentes da S.I.J. (Serviço de Investigação e Justiça), eu me orgulhava muito de vestir o meu uniforme militar, um 5º A de tropical, feito sob medida feito pelo taifeiro alfaiate do Parque de Aeronáutica dos Afonsos, o qual já não me lembra mais o nome.
Só o nome que me lembro bem, mesmo não sendo o nome completo, é o do Sargento Q AT DI Soares, que parecia o cabeça da S.I.J., pois ele se investia da condição de investigador e até, como eu tiver oportunidade de quase presenciar, pois na verdade eu apena só ouvia, um dos espancamentos de preso no xadrez do Corpo da Guarda do Parque de Aeronáutica dos Afonsos. Nesse espancamento, que ele, me pareceu, executava usando uma toalha molhada, fui convidado por ele, me recusando de pronto. Fiquei muito aliviado por ele não ter insistido nisso comigo. Outros que suponho ter acontecido, eu só ouvia através de boatos feitos a “boca miúda” pelos colegas (percevejos) que moravam no quartel ou passavam a maior parte do tempo em nossos alojamentos.
A partir do 6º ano de serviço ativo, já sem a certeza se iria conseguir fazer mais alguma prova no concurso para sargento especialista, cujo preparo eu estava adquirindo no Curso Soeiro há algum tempo, pois o meu último requerimento fora indeferido por não estar mais dentro do limite de idade, tendo sido o requerimento anterior indeferido com a alegação de não ter havido tempo hábil para entrada do mesmo na E.E.Aer. Foi, também, nesse período, que começaram o cadastramento dos cabos para fazerem cursos, cada um em sua especialidade, com o objetivo de se prepararem para o mercado de trabalho. Só os de chapeamento, mecânica de avião e viaturas foram “favorecidos” com o curso que foi durante o expediente.
Nessas alturas do campeonato, todos mais amadurecidos pela idade, pois já não éramos mais adolescentes, presos à condição de militar, concorrendo à escala de serviço, depois de terminado o expediente nas seções, que ficou limitada para nós que atingimos a antiguidade, bem próximo da conclusão do fatídico oito anos de serviço, com a esperança que não morria, quase se transformando em certeza de termos a extinção da Portaria 1.104, retornando nossos direitos com base na Lei do Serviço Militar que fora ignorada pelas autoridades, “batia” nos momentos de introspecção, uma angustia enorme de termos alcançado mais de 25 anos de idade com a incerteza de continuarmos no serviço ativo, tão desejado por nós desde 1º de julho de 1965, quando a segunda turma foi incorporada às fileiras da FAB.
Reforçando a conclusão; tivemos a nossa baixa forçada (expulsão?) em 1973, tendo que correr atrás de documentação hábil: carteira de identidade, titulo de eleitor e carteira de trabalho, tudo necessária para qualquer um “conseguir” um emprego. Todos, menos nós, porque as dificuldades foram grandes, pois pude notar que os recrutadores das empresas se esforçavam para entender porque um homem de 28 anos se apresentava para concorrer a uma vaga de emprego com toda sua documentação novinha em folha e com uma carteira profissional em branco, em plena “vigência” da revolução militar iniciada em 1964. Essa foi a pergunta que não me fizeram e não tive oportunidade de responder.
Conclusão final; tive que voltar à seção mobilizadora 31 da antiga Escola de Aeronáutica por quatro anos consecutivos para visto no Certificado de Reservista. Então eu já estava empregado, graças à interferência de minha Tia Lea, que era funcionária antiga das Lojas do Ponto Frio e era bastante considerada na Empresa, me garantindo uma vaga de Auxiliar de Escritório, exercida por mim no Setor de Cobranças, tendo conseguido uma pequena promoção a Auxiliar Administrativo, não conseguindo a promoção seguinte que seria a de Chefe de Setor, por ter havido a demissão de um grande número de funcionários antigos, para enxugar a Folha de Pagamento na crise do plano Collor.